Um texto, não-pragmático
que, oportunamente, só vai te deixar mais reticente:
Após 6 anos sem ataques
diretos, os EUA quebraram seu jejum, autorizando um ataque de 59 mísseis contra uma base aérea Síria.
Razões? As palavras do
próprio presidente Trump, bem como do secretário de Estado Rex Tillerson, bem
como do enviado das Nações Unidas Nikki Haley foram categóricas: não há dúvidas
de que Basshar Al Assad foi responsável pelo atentado com armas químicas na
cidade rebelde ao Norte da Síria, Khan Sheikhoun, o qual matou no mínimo 80
pessoas nessa semana.
Nem é preciso dizer que
a represália Norte- americana através do lançamento de mísseis só foi gerada
mais destruição. Afinal, pra onde caminha a humanidade a qual vale-se de mais violência
para deter a violência? Não creio que ninguém no pleno exercício da sua
humanidade concorde com isso - talvez os defensores da pena de morte, o que não
é meu caso. Mas esse é um outro debate, pra uma outra ocasião. O fato é que a
legislação internacional prevê intervenções para certas situações: caso Bashar
Al Assad tenha de fato usado armas químicas, ele teria quebrado as diretrizes
do Chemical Weapons Convention e do UN Security Council do acordo de não-uso de
armas químicas e a represália estadunidense, nesse caso, poderia ser perpetrada. (1)
Em face disso, vale o
SÉRIO questionamento: Bashar Al Assad usou mesmo o gás sarin? Será que Donald
Trump, o Secretário de Estado e o enviado das Nações Unidas estão
irredutivelmente corretos?
Até então, não há plena
concordância e o simples ‘’talvez’’ nessa história toda é de arrepiar: seria desabonador
saber que um novo imbróglio internacional estaria a caminho devido a um míssil equivocadamente
lançado por parte dos EUA. Até porque os EUA são renomadamente peritos em meter
o pé na jaca quando se trata em intervenções no oriente a exemplo dos efeitos
escabrosos de suas intervenções no Oriente médio. As tentativas passadas de "estabilizar o Oriente Médio" provaram ser desastrosas tanto no Iraque como no Afeganistão, aumentando apenas o tumulto e, finalmente, dando à luz o ISIS. Essas intervenções conduziriam a mais caos, sangue, guerra e, claro, aos refugiados que inundaram a Europa nos últimos anos. (4)
Para fins de
entendimento, comparemos o caso atual a outro de amplitudes muito similares: o
atentado em 2013 a Ghouta (um subúrbio de Damasco) com armas químicas.
Estaria a história apenas se repetindo?
Em 2013, houve em Ghouta, subúrbio de Damasco um ataque com
gás sarim cuja autoria foi atribuída, num primeiro momento, ao governo Sírio.
Porém o jornalista investigativo Seymour Hersh obteve documentos da DIA-
Defense Intelligente Agency- a organização espiã do Pentágono- os quais
sugeriam que Nusra Front –um ramo da Al Qaeda na Síria- fosse o verdadeiro
responsável pelo ataque ataque. (2)
De acordo com a investigação de Hersh, os ataques haviam
sido liderados pelos rebeldes hijadistas: eles queriam que Washington
presumisse que Assad havia cruzado a ‘’red line’’traçada por Obama durante a
sua gestão, incitando os EUA a entrar em guerra, o que fragilizaria o governo
central sírio.
Na época, Obama foi
convencido a não enviar mísseis pelos conselhos de James Clapper, diretor da Inteligência
Nacional desse tempo. James fundamentara seu conselho nos que aprendeu de um
livro publicado pelo expert em Oriente Médio chamado Michael Luders.
Adiante foi confirmado:
o exército sírio de fato não perpetrara o gás. As pesquisas que foram conduzidas
por um laboratório militar britânico verificaram que o gás usado pelo exército sírio
tinha uma composição diferente do que havia sido usado nos ataques. Bingo: quão
catastrófica teria sido o envio equivocado de um míssil pelos EUA? Felizmente
tiveram a prudência de investigar de perto a situação antes de consumar o
ataque.
Por outro lado, a
resposta do atual governo norte-americano destoou muito quanto ao evento
trágico dessa semana, uma vez que o míssil fora enviado antes de aprofundarem as investigações
Para piorar, alguns
Experts já sugerem que os responsáveis pelo ataque com armas químicas podem ter
sido rebeldes hijadi e não Assad, tal qual o episódio de Ghouta.
Segundo o diretor do
Centro de Pesquisa para o Mundo Árabe de Johannes Gutemberg University in
Mainz, apenas grupos de oposição armados poderiam se beneficiar com um ataque
de armas químicas, pois se os EUA tentarem derrotar regime de Assad, os rebeldes
ganham mais força.
Ademais, tem-se que o grupo mais significante no norte as Síria –área
na qual ocorreu o recente atentado- é a Al Qaeda, que juntamente com outros hijadis
extremistas, tornou-se a soberana em cidades como Idlib, por exemplo.
Por outro lado, vê-se que Assad não tem medido esforços- nem tão
pouco crueldade- para se manter no poder. Logo, é minimamente lógico se
perguntar por que Assad traria a opinião do mundo contra si mesmo, visto que,
com a quebra dos acordos internacionais de não proliferação de armamentos nucleares,
tal ato arbitrário erodiria a autoridade local que ele tenta a todo custo
preservar.
E se ao contrário de enviar o míssil precocemente, os EUA
tivesse se debruçado mais algum tempo em pesquisas? Uma comprovação legítima
dos perpetradores do ataque não seria o mais prudente? Fui atrás de saber se
existiam centros de pesquisa pra isso e encontrei algo ainda mais intrigante: o próprio governo
Sírio tem se mostrado reticente a permitir pesquisas, colocando algumas
limitações sobre elas, pois segundo os correspondentes do governo, há muito viés nas pesquisas, tornando-as menos científicas e mais políticas.
Em razão disso, surgiu em Liechtenstein uma salutar iniciativa
chamada: ‘’International, Impartial and Independent Mechanism’’ (Internacional,
Imparcial e Independente Mecanismo) a qual, como o nome já diz, busca realizar
investigações independentes, deslocadas de governos centralizadores, que visa
coletar informações palpáveis afim de formalizar, coletar e processar
evidências de crimes de guerra de modo a corrigir os problemas da Síria
minimizando o viés ideológico em em benefício de certos grupos de interesses que esses achados científicos possam apresentar. (3)
Como foi dito no começo, esse texto não teve propósito algum além de
deixar o leitor com uma pulguinha atrás da orelha sobre as ações da política externa dos EUA,
mostrando que a história muitas vezes se repete, mesmo que com uma nova
roupagem. Possivelmente, a Khan Sheikhoun dessa semana foi só um foreshadowing
da Ghouta de 2013. Porém, dessa vez, há um agravante muito pior: os 59 mísseis já
foram lançados. Resta a nós apenas esperarmos que as desmedidas intervenções
americanas não culminem em mais imbróglios internacionais - a exemplo do Afeganistão, do Iraque e da formação do ISIS- os quais brotaram dessas intervenções.
Enquanto isso, com ou sem míssil, a maior fatia de mortos da
guerra da Síria continuam sendo crianças, mulheres e idosos e não soldados de
guerra.
May ,then, humanity be at first, not [USA]america first.
(1) http://www.dw.com/en/us-launches-cruise-missile-strikes-on-syria/a-38332229
(2) http://www.dw.com/en/is-assad-to-blame-for-the-chemical-weapons-attack-in-syria/a-38330217
(3) http://www.dw.com/en/russia-and-syria-counter-claims-of-responsibility-for-gas-attack/a-38326368
(4) https://fee.org/articles/israel-europe-and-the-us-cannot-fix-syria/?utm_medium=push&utm_source=push_notification
COMO AJUDAR A SÍRIA: http://coolmompicks.com/blog/2017/04/06/how-to-help-syria-best-organizations/
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