quarta-feira, 8 de julho de 2015
Página 86 - Estética do Oprimido
''Explicações sobre a obra influenciam a sua percepção. Nos primeiros meses de 2008, o Leopold Museum, de Viena, Áustria, apresentou quadros do pintor Albin Legger-Lienz. Fez-se potente escândalo. Organizações judaicas pediram que a Mostra fosse fechada e os quadros confiscados, enquanto o Museu alegava a importância histórica do pintor e sua obra. Estava eu trabalhando naquela cidade e quis ver com meus olhos a razão de tanta bulha. Entrei no Museu de má vontade, desci ao porão onde estavam os quadros de Legger-Lienz. Estava pronto para detestá-los – não suporto aqueles que aderiram ao nazismo, seja qual for sua profissão. Mesmo assim, comecei a achar que os quadros não eram ruins, apesar da ideologia do pintor, mas continuei achando defeitos em todos eles: sempre encontramos razões de sobra quando queremos detestar algo. Na última parede da última sala, porém, um texto explicava as razões do explosivo escândalo: alguns daqueles quadros haviam sido roubados de casas de judeus perseguidos pelo regime, confiscados por oficiais do exército nazista durante a Segunda Guerra Mundial e vendidos, depois da guerra, a um colecionador privado, que revendera os quadros suspeitos ao Museu, que, mesmo sem saber do histórico de cada obra, não hesitou em expô-las. As organizações judaicas queriam que os quadros fossem guardados em lugar seguro até que se descobrissem seus verdadeiros proprietários judeus. Então... Albin Legger-Lienz, nascido em 1868 e falecido em 1926, não era nazista. Que alívio... Voltei pelo mesmo caminho da ida, olhando cada quadro pela segunda vez: como eram belos! Talvez eu os achasse ainda mais belos do que na verdade eram porque sentia necessidade de pagar minha culpa estética em julgá-los sem conhecer sua verdade política...''
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